terça-feira, 21 de novembro de 2017

Quando você resolveu sair de casa

Hoje, dia 22 de novembro de 2017, por volta das 17h, você veio me dizer que queria conversar comigo. Veio daquele jeito sério como faz quando vai me pedir alguma coisa. Mas você só maqueou o seu pedido. Na verdade veio me dizer que ia dividir um apartamento com seu amigo Vitor.

Sei que filho a gente cria pro mundo e blá blá blá. Mas desde sempre tem sido eu e você. Há mais de 18 anos, tem sido a gente. E a notícia / bomba bombástica veio com data. Curto espaço de tempo. Como dormir e acordar sem você em tempo de semanas? Pergunta só valida para filhos, porque pra qualquer outra pessoa a gente tem de tocar o foda-se. Mas você?

Chorei. Neguei. Disse não. Te joguei na cara coisas que não deveria, briguei, falei da sua ingratidão. Bem agora que tô arrumando nosso cantinho lá no Alexandre, poxa. Espera, pedi. Arruma um job antes, falei. Absurdo a sua avó te ajudar sem me avisar, como você toma esse tipo de decisão impetuosa assim, como vai fazer isso comigo? Eu. Comigo, eu.

Dado o devido tempo e as devidas lágrimas, te pedi, sua avó pediu também, que maturasse a ideia, que desse aos outros o tempo da maturação, vamos fazer combinados, por que?

Porque, meu filho, o tempo é o seu. A pressa é a sua. Eu, na verdade, não sou nem causa nem consequência.

Sua avó, puta merda, sua avó teve destreza pra tratar o assunto enquanto eu me recolhia no meu sofrimento. Motivo, ela perguntou. Disse achar abrupto e que nem era a sua melhor decisão. Melhor do que eu, ouviu. Te deu espaço pra falar do AP, te fez perguntas pertinentes e explicou porque tanto me doía o coração, e ainda dói. Conversou com você, comigo. Eu falei com a outra avó.

Realmente na natureza da gente não cabe nenhuma certeza, né?

Se não der certo, volta, se doer, chora, se bater, apanhe. Se arder, deixa.

Meu menino, quero muito que vá viver uma vida que eu não vivi e sempre quis. Uma experiência que você merece ter. Mas ainda estou certa, não vá agora. Aliás, não vá tão cedo, feche ciclos, abra outros. Mas eu conheço o seu olhar, filho. Você quer dar um tapa na cara da vida faz tempos. E quer ir agora. Eu disse vá, enquanto tomávamos uma justa cerveja no boteco da esquina. É, eu disse. Vá, menino, voar sozinho. Como disse a nossa amiga Sharon: "Não dizem que os filhos são criados para o mundo?! Que bom ele ele ja sabe voar!!!!". É. Ainda bem que não te cortei as asas. E ainda bem que sempre soube voar.

Nós dois sabemos o quanto será difícil, o período de adaptações que virá em breve. Eu fico, você vai. Sentiremos saudades do todo dia.

Você me disse agora pouco que fará o impossível para não me ver triste e que nossos problemas não são nem de longe sérios. É, filho. Quanta sabedoria para os seus poucos 18 anos. Te amo sem medida e ao quero te ver feliz. Colo de mãe é coisa cara, rara e boa. Ainda bem que você o tem.

Vai, passarinho, vai passarinhar. Vou viver a dor que deve ser vivida e há de melhorar.

Orgulhe-se, pois aprender a viver inteiramente sem você é a coisa mais difícil que vou fazer na vida. Mas que coisa, né? Mãe só quer isso, que filho siga em frente, dê a cara a tapa com coragem, que viva com intensidade cada segundo.

Eu só não sabia que seria tão rápido e inesperado, mas que você um dia ia, ah, isso eu já sabia.

Mas te amar eu amo e ô! É por demais, Diego.

Mãe.

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Tem que ser mais


Então tem que ser mais, né? É.

Tem que ser ascendente. Tem que ser extenso, mais importante, mais marcante, mais um pouco e um pouquinho ainda mais do que isso. Tem que ser maior. Tem que ser imensurável, glorioso, tangente e tangível. Intenso.

Tem que ser mais que providencial. Tem que ser improcedente.

Tem que ter mais sede, mais fome, tem que ter buraco sem fundo. Tem que ser claro, iluminado, inegável de fechar os olhos e amar almejar mais, regozijar, pleitear, in-saciar.

Tem que voar, tem que ter céu, tem que ser alto. Não pode ser caixa. Não pode ser gaiola. Não pode sufocar alma ou águia. Tem que brilhar enquanto plaina. Tem que ser leve, dócil e doce. Tem que ser gostoso.

É que tem que ser a mais, um tanto, tanto de muito. Tem que ser quase tudo.

Porque tem que ser de extrema exatidão do tamanho que não se sabe que pode expandir pra caber de dentro. Pra fora.

Tem que ter tampa, tem que ter ouvido, tem que aquecer, que resfriar, que espirrar, que provocar, que desejar, que aprofundar, imaginar, sentir e partir.

Tem que ser muito mais.






quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Emenda

Uma pessoa
Emenda
Outra

Entrega absoluta
Súbita
Total
De certo e de incerto

Se a vida é feita de encontros, embora haja tantos desencontros, encontremo-nos. Reencontro. Se a vida tem cheiro, que seja de pele macia, de doce, de chamego de conchinha.

Faz parte da emenda
O beijo suave
O seco
O abraço abraçado
Dado
Encontrado

Quando há o encontro das almas inevitáveis, daquelas que nascem para o tranco... Ah... É isso que conheço como amor. Tem liga. Tem volúpia, tem sintomas de saudade, tem vontade, tem desejo de ser junto, mesmo sendo um + um = um. E há de vibrar a sorte destes que encontram a tampa da laranja, coisa rara de se ver. Não são príncipes nem princesas. São dois.

Corpo
Corpo
Contíguo
Elusivo de começo e fim
Um que torna outro e outro que torna um

Uma bandeja na mesa de centro da sala, um criado mudo, um lado da cama, um vinho nunca tomado, chocolates argentinos, meias, roupas jogadas ao lado da cama, suor, fotografia em P&B, flores, girassóis e um beija-flor. Um canto de amasso, poses e cenas, viagens, filmes, momentos, placas, paradas, cachoeiras, histórias, lutas, cosquinha, Cristo Redentor, samba, forró e bolero. É um todo de acontecer que só acontece junto. É uma praia do sono, uma caminhada, conchinhas, cerveja de mel, uma rede Antonieta, um sirigueijo, um show que foi perdido, um presente, uma surpresa e um anel.

Quando uma só quer
É torrente de tentar e não alcançar
Como querer gritar e não ter voz
Ou tentar correr e não sair do lugar
É de dor temível a qualquer bicho papão
É forte como uma faca que rasga o peito
É luta sem causa, é sofreguidão sem apego
E final sem fim...

Agora
Do contrário, do inverso, de quando é vice e é versa...

É quando uma pessoa
Emenda
A outra. Na outra. São outra. São duas, mas querem ser duas juntas.
E se duas querem
Emendam
Entregam
Juram
Pelo bom e pelo ruim
Serão sempre
Terão sempre
Emenda
Liga
E Anel.

É por isso que a vida copia a arte. E é por isso que “Era uma vez...” e “Viveram felizes para sempre.” contam histórias de princesas e príncipes irreais. Porque, de tão raro que é, vira quase inacreditável existir. Mas a princesa escolhe o príncipe e o príncipe escolhe a princesa. Todos os dias. Elem juram, pelo bom e pelo ruim, serão sempre, terão sempre, emenda, liga, e Anel.

Uma pessoa
Emenda
Outra

Então...
Emenda comigo?

segunda-feira, 26 de julho de 2010

Como é que dói...

É como uma agulha que fura o dedo

Como uma faca de pão que lasca a mão

Uma ferida de mosquito que a gente coça

Ou uma taça de champagne que se anula em estilhaços

Como uma topada do dedinho na quina do sofá

Um cisco que entra no olho

Cotovelada, espirro surpresa, unha quebrada, pimenta ardida, pesadelo de monstro fantasma no armário... É rápido, de repente, um arrepio. Ligeiro. Zás.

Depois a gente sopra, coloca band-aid, toma um ar, respira fundo, cobre com cobertor, pede colo pra mãe, toma um banho e espera o remédio fazer efeito. Não é PIMBA!, mas passa.

Aí  o coração fica na berlinda de começar a normalizar, o peito enxuga a dor salgada da lágrima, a face não é mais rubra, os caminhos são mais claros e a gente... Bom, a gente pode continuar a caminhada. Vai tropicando. Mas vai. Sempre vai.


quarta-feira, 23 de junho de 2010

Por um fio

Me lembro de um livro que li muitas vezes durante a minha infancia e reli outras tantas durante todo o meu tempo de adolescente e adulta, “o equilibrista”. O livro é inequívoco na sua maneira simplista da vida dita e escrita por um fio. A vida é um fio, memorável é esta a minha lembrança mais nítida quando lembro daquela capa azul, daquele menino-palhaço-inventor de caminhos em fiapos por onde ia, pedaços que inventava.

Hoje pensei no quanto estou por um fio. Um fio do que me basta para me lançar a coragem do que pretendo, um fio do passo em falso que pode me levar ao chão, um fio da meada, a um fio da vida, a um fio da morte. Estou, estamos, caminhando com os pés firmes sobre a terra. Isso é visível, palpável, tangível. Mas a linha que construímos para tocar o chão é transparente, é até imaginária, mas, de fato, existe.

Caminhamos, as vezes, sem rumo, sem aviso. Mas sempre sob um condutor de corda fina como um suspiro imperceptível. Mas sempre existente.

Agora tem gente morrendo e ansiando por último, em tempo de soprar um penúltimo ar quente mesmo de olhos fechados. Tem gente avivando num leve choro, num grito de vida ao abrir os olhos. Tem gente construindo, tropeçando, caindo, levantando, tirando onda, deitada dormindo, deitada acordada, fazendo um carinho, torcendo, segurando a linha de outra pessoa, chorando, sobrevivendo, cantando... sobre linhas.

O cuidado pode ser pouco, pode ser grande, pode ser qualquer um. Mas é cuidado em linha, em fronte, em migalhas emaranhadas um sob as outras, transversais, controversas. Assim como o menino do livro, a gente vai indo, vai seguindo, sempre andando por um fio de cair e por um fio de equilibrar-se. Sempre por um fio.

Certo é que a linha está o tempo todo debaixo dos nossos pés descalços sendo guiada ou guiando, embolando e desembolando o tempo todo. A vida está sempre por um fio, seja lá a história ou destino de cada um. Nunca se livra dela.

É uma Constancia. É uma linha. É sempre uma vida. Vidas todas equilibristas que saem do nosso carretel de gente. Lembrando daquelas páginas coloridas de um azul aconchegante, de um menino boneco tradutor de crianças e velhinhos, adultos inoperantes, causas nunca perdidas e todo tipo de gente como eu e você.

É uma linha que não sei se tem começo vivo e término morto. Mas é a linha da vida por um fio de acontecer. E  
acontece. E é linha polida, pequena e grande, fácil e difícil.

Respiremos todo o ar das páginas do menino equilibrista e continuemos na estrada firme calçada de fios porque a vida, a vida está sempre por um fio. Eu estou num fio, meu fio fino contínuo. A vida. Equilibrista, incansável. Sempre inevitavelmente por um fio. Respiremos, então. Um fio de ar pela garganta, um barbante de ioga do fundo do peito. No fio da vida.

Carol Bahasi
23.junho.2010
21:58h

quinta-feira, 17 de junho de 2010

Uma carta de amor de uma mãe para um filho

Vou começar assim: Quero um chá de morcego! Quero chamego... Bico, Ií... Colo. Mamãe!

Quando você nasceu, meu filho, isso era tudo o que queria. Bastava ficar quentinho, alimentado e seguro. Chorava tão pouco que sua bisavó chegou a achar que você era surdo. Na verdade era um anjinho!
Você era um menino com cara de lua, bochecha rosada e risada gostosa. Olhinhos meio puxadinhos de lado, boca contornada como se tivesse sido pintada numa tela. Pezinhos gorduchos que sentiam cosquinha. Cheirinho de filho. Menino de coração bom, carinhoso, inteligente, inventor, criativo, teimoso, persistente e surpreendente.

Aprendeu a andar muito cedo. Aprendeu bem aqui, nesta casa, sob o olhar sereno da velhinha que hoje lhe estende as mãos para atravessar a sala.

Você, meu tuquinho de gente!, era uma coisa pequena que eu chamava de... chamava de “coisa” mesmo. É porque você é uma coisa, um filhote, meu menino, minha razão. Uma COISA!

Meu pequeno nunca parou de crescer. Nem mesmo quando eu tentei te convencer que tinha tomado a pílula do Peter Pan. Aliás, quantas aventuras, não? Eu seria bruxa e você iria para Howrgroad, iria para a OSS virar pequeno espião... Já vimos fadinhas coloridas, Papai Noel e até compramos O COELHINHO DA PÁSCOA! Rá. Compramos LEBRE por COELHO NINJA... Já brincamos de cavalinho, de Lego, de caverna, de cientista, de pesquisadores... Já acampamos no mato e já acampamos na praia... na chuva. E, falando em chuva, já corremos debaixo da chuva ao som de “corre, mãe!”, “pula, mãe”, “planta bananeira, mãe!”. Já brincamos, já cantamos, já brigamos... Já choramos e pedimos desculpas. Catamos conchinhas, pescamos, fizemos comidinha de mentira e comida de verdade. Já andamos muito de mãos dadas sem direção... Já nos abraçamos, cheiramos, beijamos. Sempre nos tivemos bem, nos queremos bem. Se isso é sorte, eu não sei. Mas a certeza que tenho é que o que temos hoje é fruto de cada escolha que fizemos todos os dias. Boas e ruins, sempre escolhas.

Meu filhote... É muito bom olhar pro passado. É um orgulho imenso ver que conseguimos ser felizes, que vivemos a vida até então com intensidade, peraltas da liberdade como os artistas circenses. Crianças com olhar de magia de quem assiste a um show onde se tiram passarinhos do bolso. É com muito orgulho que lhe apresento MEU FILHO pra quem quer que seja. É gostoso vê-lo debulhar as cordas de um violão, de uma guitarra. Me faz bem vê-lo produzindo experiências científicas das mais loucas possíveis. Te ver arrumando, fazendo e desfazendo, ao seu modo, coisas da tecnologia. Te ver pintando uma tela, fazendo arte com “coisas de fazer arte”, vê-lo aprendendo, cedendo, tolerando...


É como se eu não pudesse existir sem você. Porque você, rapazinho, é a pessoa mais importante da minha vida, a coisinha mais preciosa, o mais extraordinário, a melhor coisa que eu tenho, meu chuchu, minha vida! Além de meu filho, é um neto, um bisneto, um sobrinho neto, um neto postiço, um primo, um amigo, um camarada, uma pessoa completa que saiu bem de dentro de mim. É parto do meu útero de mãe e feitio do meu coração.

Te amo mais do que existem palavras em todas as línguas. É enorme, é crescente, é lindo, é eterno. É incondicional.

Feliz aniversário, feliz ano novo de vida!

Então vem cá agora e me dá um abraço apertado, um beijo chocante e, pra variar, um chazinho de morcego acompanhado de chamego!
Mãe
17/06/2010

domingo, 9 de maio de 2010